COLUNA
18/09/2014
Eles não confiam na
'sociedade'; só pensam no Estado, na interferência em tudo
As eleições para presidente não serão
“normais” — apenas uma disputa entre dois partidos para ver quem fica com o
poder. Não. Trata-se de
uma batalha entre democratas e não democratas. Está na hora de abrirmos os olhos, porque está em curso o desejo de
Dilma e seu partido de tomar
o governo para mudar o Estado. Não tenho mais saco para tentar análises
políticas sobre a “não política”. Não aguento mais tentar ser “sensato” sobre a
insensatez. Por isso, só me resta fazer a lista do que considero as doenças
infantis do petismo, cuja permanência no poder pode arrasar a sociedade
brasileira de forma irreversível.
O petismo tem a compulsão à repetição
do que houve em 1963; querem refazer o tempo do Jango, quando não conseguiram
levá-lo para uma revolução imaginária, infactível. Os petistas querem a democracia do Comitê Central,
o centralismo democrático, o eufemismo que Lênin inventou para controlar Estado
e sociedade. Eles não confiam na “sociedade”; só pensam no Estado, na interferência em tudo, no
comportamento dos bancos, nos analistas de mercado e principalmente no velho
sonho de limitar a liberdade de opinião. Assinam embaixo da frase de
Stálin: “As ideias são muito mais poderosas do que as armas. Nós não permitimos
que nossos inimigos tenham armas, por que deveríamos permitir que tenham
ideias?”. Nossa maior doença — o Estado canceroso — será ignorada e terá uma
recaída talvez fatal. Não fazem autocrítica e não querem ser criticados. A
teimosia de Dilma é total — vai continuar errando com galhardia brizolista. Sua
ideologia é falha, mal assimilada nessa correria sindicalista e pelega. Até
agora governaram um país capitalista com regras e métodos anticapitalistas — dá
no desastre econômico a que assistimos. Eles odeiam a competência. Acham que
administrar é coisa de burguês — vejam o estrago atual. Acham que planejam a
História, que “fazem” a História. Por isso, adotaram a mui útil “mentira
revolucionária”. Assim, podem ocultar tudo da sociedade para o “bem dela”.
Aliaram-se ao que há de pior entre os reacionários brasileiros e vivem a
volúpia de imitá-los, com um adorável frisson perverso ao
cometerem malfeitos para “fins justos”. Aliás nem sabem o que são seus “fins”;
têm uma vaga ideia de “projeto” que não passa de um sarapatel de
“gramscianismo” vulgar com getulismo tardio e um desenvolvimentismo dos anos
1960. Foi assim que criaram a “roubalheira de esquerda”, que chamam de
“desapropriação” de dinheiro da burguesia. Isso justificou o mensalão, feito
para eleger Dirceu presidente em 2010. Fracassaram. Aliás, o PT abriga muitos fracassados porque, ao se
dizerem “revolucionários” sentem-se superiores a nós, os alienados, os
neoliberais, os direitistas, os vendidos ao imperialismo.
Não entendem o mundo atual e continuam
com os pressupostos de uma política dos anos 1930 na URSS. Leiam os livros do
período e constatem se um Gilberto Carvalho não pensa igualzinho ao Molotov.
Para eles, a oposição é a união da “burguesia” contra o “povo” . No entanto, quem se aliou à pior
burguesia patrimonialista foram eles; ou Sarney, Renan, Jucá, Maluf e Severino
do macarrão são bolcheviques? Petistas só pensam no passado como vítimas ou no
futuro como salvadores e heróis. O presente é ignorado, pois eles não
têm reflexão crítica para entendê-lo. Adoram estar num partido que pensa por
eles. Dá um alívio não ter de pensar — só obedecer. A mediocridade sonha com o
futuro onipotente. A morte súbita de Eduardo Campos pirou os “hegelianozinhos
de pacotilha” que descobriram que a História é intempestiva e não obedece ao
Rui Falcão. Agora, rumam
em massa para Pernambuco para elogiar quem chamavam de “traidor e menino
mimado”.
Querem
criar os tais “conselhos” sociais, para adiar os problemas, fingindo uma
“humildade democrática” para “ouvir” a população, de modo a ocultar seu
autoritarismo renitente. Vivem a ideia de um futuro socialista
como o substituto do sonho de “imortalidade” dos cristãos. Comunista não morre;
vira um conceito. O homem é um ser social, e o “ser social” nunca morre. Para
eles (e para o Kim da Coreia do Norte), o indivíduo é uma ilusão que criou essa
dor melodramática. Quem morre é pequeno-burguês. Muitos intelectuais e artistas
que sabem dessas doenças infantis preferem cavalgar o erro a mudar de ideia.
Consola a consciência ter uma estrelinha vermelha pendurada na alma.
Os petistas têm uma visão de mundo
deturpada por conceitos compartimentados e acusatórios: luta de classes,
vitimização, culpados e inocentes, traidores e traídos. Acham que a
complexidade é um complô contra eles, acham a circularidade inevitável da vida
uma armação do neoliberalismo internacional. Confundem simplicidade com
simplismo. Nunca fazem parte do erro do mundo; sentem-se superiores a nós, tocados
pelo dedo de Deus.
Agora, no mundo modificado pelo fim do
socialismo real, pelos impasses do Oriente Médio, pela crise financeira do
capitalismo, pela revolução digital, sentem falta de uma ideologia que os
justifique e absolva. E como não existe nenhuma disponível (social-democracia,
nem pensar...), apelam para o tosco bolivarianismo que nos contamina aos
poucos. É inacreditável como batem cabeça para ditadores e criminosos, de
Ahmadinejad a Maduro, de Putin a Fidel, tudo em volta do fascismo populista de
Chávez.
Dilma se acha Brizola, Lula imita
Getúlio: nacionalismo, manipulação da liberdade, ódio a estrangeiros,
desconfiança dos desejos da sociedade. Nada pior do que o brizolismo-getulista
neste momento do país. Estávamos prontos para decolar no mundo contemporâneo,
mas seguraram o avião e voltamos para trás.
Por isso, repito a frase oportuna de
Baudrillard:
“O comunismo, hoje desintegrado,
tornou-se viral, capaz de contaminar o mundo inteiro; não através da ideologia,
nem do seu modelo de funcionamento, mas através do seu modelo de
desfuncionamento e da desestruturação da vida social”.
Este é o perigo.