10/06/2015
às 12:43
\ Democracia, Filosofia
política
Esquerda e direita: separando o joio do trigo
Os termos “esquerda” e “direita”
geram muita confusão, a ponto de várias pessoas preferirem ignorá-los,
considerá-los coisa do passado. Todo rótulo é simplista e, portanto,
limitado. Não é possível encaixar uma visão de mundo inteira em apenas dois
opostos, pois toda uma região intermediária fica esquecida. No mais, os termos
tinham uma significação mais óbvia em sua origem, na Revolução Francesa, o que
ainda influencia muita gente: esquerda é “povo”, enquanto direita é
“aristocracia”. Todo cuidado é pouco, portanto.
Dito
isso, não sou dos que preferem jogar fora os conceitos. Acho que devem ser
usados sim, com cautela. Tenho opinião parecida com a de João Pereira Coutinho,
que tratou do assunto em sua coluna desta
terça na Folha. Coutinho não se importa de se dizer de direita, um conservador,
mas faz questão de qualificar o termo, para separar o joio do trigo. Diz ele,
expondo aquilo que considera a boa direita, contra as acusações frequentes de
autoritarismo e reacionarismo...
A esquerda também pode ser
separada entre aquela revolucionária, socialista, radical, e a outra mais
moderada, social-democrata, “progressista”. Sou crítico de ambas, naturalmente,
mas com a última há possibilidade de diálogo; com a primeira, não. Quando a ala
dos radicais chama a ala mais moderada de “neoliberal”, por exemplo, está
agindo de má-fé. O PSDB seria visto como representante da esquerda
social-democrata em qualquer país civilizado do mundo; aqui, é “acusado” de ser
conservador, reacionário, “neoliberal” (como se fosse tudo sinônimo).
Quem não quer debater com a direita
de boa estirpe, aquela liberal clássica ou conservadora nos moldes britânicos,
prefere criar um espantalho e jogar todos na mesma vala comum, como se os
reacionários e autoritários fossem representantes de toda a direita. É como se
não fizéssemos, do lado de cá, distinção entre os tucanos e os petistas, pois
são todos de esquerda. Apesar da pusilanimidade irritante da “oposição” tucana, o fato
é que o PSDB representa uma esquerda bem mais civilizada do que o PT, camarada
de ditadores comunistas e de “revolucionários” marxistas (marginais, na
verdade, como as Farc e o MST).
Clamar por regime militar, destilar
homofobia por aí, ignorar o estado democrático de direito para pedir
linchamento público de marginais por justiceiros, idealizar um passado distante
em que tudo era uma maravilha, essas são bandeiras de uma direita ultrapassada,
antidemocrática, que nada tem a ver com aquela liberal ou conservadora. Com o
avanço dos “progressistas” radicais, com uma agenda de intenso relativismo
moral, com o petismo no poder, é até compreensível o desespero de alguns, que
leva a tais clamores ensandecidos. Mas não é justo misturar essa
direita com a outra, da mesma forma que não é justo dizer que toda esquerda é
socialista revolucionária.
Por fim, acho graça quando alguns
dizem que essa esquerda nem mais existe, que é paranóia de quem vive preso na
Guerra Fria.... Quem alega que esquerda não quer dizer mais socialismo não deve
conhecer o Foro de São Paulo, o Mercosul atual, a Venezuela, a reverência que
tantos idiotas úteis ainda têm por Cuba.
O ideal, como já cansei de
repetir, é que a direita decente se comunicasse de forma civilizada com a
esquerda moderada, rejeitando ambos os extremos. O problema é que nossa
esquerda moderada é covarde demais, e parece ter medo de enfrentar com rigor
seus “colegas” radicais, assim como morrem de medo de serem confundidos com os
reacionários de direita. O resultado é que cada vez mais a direita com viés autoritário
ocupa esse espaço vazio, esse vácuo que deveria ser preenchido pela esquerda
civilizada e pelos liberais e conservadores de boa estirpe, como em toda nação
desenvolvida.
Aqui, o radicalismo petista, visto
como “moderado” pelos néscios, acabou parindo uma direita mais raivosa e
autoritária, cansada de tanto abuso e da negligência da “oposição”. Se os
democratas não lutarem realmente pela democracia, que não sobreviverá se depender
do PT, então a resposta do outro lado será cada vez mais violenta. De tanto
acusar os liberais, os conservadores e até os social-democratas de
“extrema-direita”, a esquerda radical acabará atraindo a verdadeira
extrema-direita ao poder. Depois não vai adiantar ficar chorando…
PS: Um claro exemplo disso é a
questão da maioridade penal, cuja redução a imensa maioria do povo brasileiro
deseja, cansada da impunidade e da criminalidade. Não é uma bandeira da
“extrema-direita”, e sim do bom senso, moderada, algo que existe na maioria dos
países civilizados, com idades menores para punição de crimes. Mas aqui até o
PSDB se une ao PT para negociar uma alternativa, virando as costas ao povo...Reduzir
para 16 anos a idade penal é o mínimo que se espera, e isso não é uma pauta
“reacionária” ou da “extrema-direita”, a menos que esses beócios estejam
preparados para afirmar que a Suécia é um país de extrema-direita!
Rodrigo Constantino